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Alerta Hídrico no Brasil: Insights da Entrevista no "Pompa porque o Mundo Precisa de Água"

No recente e impactante episódio do nosso programa "Pompa porque o Mundo Precisa de Água" do Instituto Água Sustentável, tivemos uma conversa aprofundada com José Gescilam S. M. Uchôa (referido neste post como Uchôa) e Paulo Tarso S. Oliveira (Oliveira), os principais autores de um artigo inovador que está agitando as discussões científicas e despertando a atenção do público em geral: "Widespread potential for streamflow leakage across Brazil" (Potencial generalizado de perda de água de rios no Brasil, tradução livre). Esta pesquisa seminal lança luz sobre a complexa e importante interação entre rios e aquíferos em território brasileiro, revelando um cenário com implicações significativas para a gestão hídrica.

Fonte: https://www.nature.com/articles/s41467-024-54370-3

O Professor Água, Everton de Oliveira, conduziu a entrevista com os pesquisadores, que compartilharam sua surpresa com a extraordinária repercussão do estudo. Oliveira (autor) destacou a importância de artigos científicos alcançarem um público amplo. Uchôa e Oliveira, ambos com forte ligação com a Escola de Engenharia de São Carlos (USP), explicaram como a colaboração para esta pesquisa nasceu de interações acadêmicas e uma afinidade de interesses na área de bacias hidrográficas e interações rio-aquífero. O time multidisciplinar envolveu pesquisadores de diversas instituições do Brasil e do exterior, como a Universidade da Califórnia em Santa Bárbara e a Colorado State University.

Veja a entrevista aqui: https://youtu.be/MSF8yZ45GcM?si=yZrlefyDnjmNXkDP

Metodologia para seleção de dados consistentes

Oliveira detalhou a metodologia da pesquisa, que se inspirou no trabalho pioneiro do Professor Scott Jasechko nos Estados Unidos. A abordagem central envolveu a análise comparativa dos níveis de água em milhares de poços com a elevação dos rios mais próximos. No entanto, os pesquisadores enfatizaram os desafios significativos na obtenção de dados confiáveis em escala nacional no Brasil, contrastando com a maior disponibilidade de informações nos EUA. Para assegurar uma conexão hidráulica plausível entre os poços e os rios, foram aplicados critérios rigorosos, como uma distância máxima de 1 km e uma profundidade de poço inferior a 100 metros, visando principalmente aquíferos livres. Esta seleção resultou na análise de aproximadamente 17.972 poços de um total inicial de 146.234 com dados consistentes.

Rios naturalmente influentes (losing)

Durante a entrevista, a distinção entre rios influentes (ou perdedores, "losing rivers") e rios efluentes (ou ganhadores, "gaining rivers") foi claramente explicada. Rios influentes são aqueles que perdem água para o aquífero subjacente, seja naturalmente ou induzidos por atividades humanas, enquanto rios efluentes recebem água do aquífero, contribuindo para sua vazão perene.

O achado mais divulgado da pesquisa, de que 55% dos rios avaliados demonstraram potencial para perder água para os aquíferos, gerou grande debate. É crucial reiterar, conforme sublinharam Uchôa e Oliveira, que esta porcentagem se aplica especificamente aos rios onde havia dados de poços próximos e que atendiam aos critérios estabelecidos para a análise. Rios em áreas remotas ou sem monitoramento de poços próximos não foram incluídos na avaliação. Em regiões com intenso uso de água subterrânea, como as importantes bacias do São Francisco e do Verde Grande, a proporção de rios potencialmente perdedores é ainda mais elevada, atingindo cerca de 60% e 74%, respectivamente. Salientaram, entretanto, que rios intermitentes do semi-árido brasileiro são naturalmente efluentes, independente da existência de poços.

Lidando com incertezas

Os pesquisadores também abordaram as inevitáveis incertezas em um estudo de abrangência nacional. A estimativa da elevação da superfície da água nos rios foi baseada em dados de elevação do terreno (NASADEM) com resolução de 30 metros, corrigidos por uma correlação com a altura da cheia estimada (Q95). A ausência de dados geomorfológicos detalhados dos rios em escala nacional, como largura e profundidade, introduz limitações na precisão dessa estimativa, especialmente para rios maiores. A predominância de dados estáticos de nível de água nos poços (medições pontuais) em contraste com dados de monitoramento contínuo, como os da Rede Integrada de Monitoramento de Águas Subterrâneas (RIMAS), também representa um desafio para compreender as flutuações dinâmicas nas trocas rio-aquífero, particularmente em áreas com alta demanda de água subterrânea.

Muita água subterrânea para ser usada, com critério. 

No que concerne às implicações urgentes para a gestão integrada de recursos hídricos no Brasil, Uchôa e Oliveira defenderam enfaticamente a necessidade de uma visão holística da água, que considere as águas superficiais e subterrâneas como um único sistema interconectado. Em regiões com estresse hídrico ou em expansão agrícola, a outorga para perfuração de novos poços deveria ser precedida por estudos detalhados que avaliem o potencial impacto nas fontes de água vizinhas, tanto subterrâneas quanto superficiais. 

Apesar do vasto potencial do Brasil para expandir a agricultura irrigada, os pesquisadores alertaram para a importância de um planejamento criterioso e sustentável do uso da água, evitando o esgotamento dos recursos hídricos e a degradação dos ecossistemas.

Sem estudos, sem gestão adequada

Para aprofundar a compreensão das interações rio-aquífero, Uchôa e Oliveira destacaram a necessidade de mais pesquisas em escalas regionais e locais, que possam validar e refinar os achados em nível nacional. Projetos como o monitoramento contínuo da temperatura do Ribeirão da Onça utilizando fibra ótica (DTS) ilustram os esforços nessa direção, permitindo a identificação precisa de pontos de ganho e perda de água ao longo do curso fluvial. Uchôa também mencionou a próxima publicação de uma base de dados compilada, com informações de poços e outros dados hidrogeológicos e hidrológicos, que estará disponível para a comunidade científica, incentivando novos estudos na área. 

Os pesquisadores expressaram a esperança de que a atenção gerada por este trabalho possa estimular maiores investimentos em infraestrutura de monitoramento hidrogeológico e hidrográfico por parte de órgãos governamentais como a ANA e o SGB, com a continuidade essencial das séries de dados para a compreensão de impactos a longo prazo.

Grande potencial de uso de água subterrânea

Em sua defesa do uso da água subterrânea no Brasil, Oliveira e Uchôa enfatizaram, durante a entrevista, que, apesar dos achados sobre o potencial de rios perdedores, a água subterrânea possui um grande potencial para o desenvolvimento do Brasil, especialmente na agricultura irrigada e no abastecimento humano. Eles ressaltaram que, comparativamente a outros países como os Estados Unidos, o uso de água subterrânea no Brasil ainda é modesto, e que, com planejamento criterioso e gestão integrada das águas superficiais e subterrâneas, é possível expandir seu uso de forma sustentável, contribuindo para a segurança alimentar e hídrica do país.

Chamado de alerta sobre o uso racional da água no Brasil

Em suma, o estudo "Widespread potential for streamflow leakage across Brazil" representa um alerta crucial sobre a interconexão dos sistemas hídricos brasileiros e a necessidade premente de uma mudança de paradigma na gestão da água, que integre a dinâmica entre rios e aquíferos para garantir a segurança hídrica e a sustentabilidade ambiental no país.

Para uma compreensão completa e detalhada desta importante pesquisa, convidamos a acessar o artigo original, que está disponível para acesso livre (link abaixo). Recomendamos a leitura para todos os interessados em recursos hídricos, meio ambiente e desenvolvimento sustentável no Brasil.

Divulgação do Blog LinkedIn: Alerta Hídrico no Brasil: Novos Estudos Sobre a Conexão Entre Rios e Aquíferos

Uma recente entrevista do programa Pompa porque o Mundo Precisa de Água, do Instituto Água Sustentável, trouxe à tona um estudo inovador sobre a interação entre rios e aquíferos no Brasil. Os pesquisadores José Gescilam S. M. Uchôa e Paulo Tarso S. Oliveira apresentaram os principais achados do artigo Widespread potential for streamflow leakage across Brazil, que revela que 55% dos rios analisados demonstram potencial de perda de água para o subsolo. Esse dado reforça a importância de uma abordagem integrada na gestão dos recursos hídricos do país.

A pesquisa utilizou uma metodologia criteriosa para analisar a relação entre a elevação dos rios e os níveis de água em milhares de poços. Aplicando critérios rigorosos de seleção, os pesquisadores avaliaram mais de 17 mil poços distribuídos pelo Brasil. O estudo identificou que, em regiões com uso intenso de água subterrânea, como as bacias do São Francisco e do Verde Grande, a proporção de rios potencialmente perdedores chega a 60% e 74%, respectivamente. Esses achados ressaltam a necessidade de uma melhor regulamentação na exploração dos aquíferos.

Além das implicações para a gestão hídrica, a entrevista destacou as incertezas inerentes ao estudo, como a escassez de dados geomorfológicos detalhados sobre os rios brasileiros. Os pesquisadores alertaram para a necessidade de mais investimentos em infraestrutura de monitoramento hidrogeológico, essenciais para a tomada de decisões eficazes. A expansão da agricultura irrigada, por exemplo, deve ser precedida por estudos aprofundados para evitar impactos negativos nos recursos hídricos superficiais e subterrâneos.

Apesar dos desafios, Uchôa e Oliveira reforçaram o grande potencial da água subterrânea para abastecimento e desenvolvimento sustentável no Brasil. No entanto, para garantir seu uso responsável, é fundamental considerar a interdependência entre os sistemas hídricos. Para mais detalhes sobre essa pesquisa essencial para a segurança hídrica do país, acesse a matéria completa no link: https://www.nature.com/articles/s41467-024-54370-3