Skip to main content

Dia Mundial da População

Celebrado em 11 de julho, o Dia Mundial da População foi estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1989 com o objetivo de chamar atenção para questões críticas relacionadas ao crescimento populacional e seus impactos no desenvolvimento sustentável. A data remete a 11 de julho de 1987, quando a população mundial atingiu a marca simbólica de 5 bilhões de pessoas. Desde então, o mundo testemunhou um aumento acelerado no número de habitantes, superando 8 bilhões em 2022 (UNITED NATIONS, 2022). Esse crescimento, embora associado a avanços em saúde, alimentação e tecnologia, impõe desafios imensos à gestão de recursos naturais, especialmente à água — recurso essencial para a vida, a economia e os ecossistemas.

 

A água doce disponível no planeta corresponde a apenas cerca de 2,5% da água total, e grande parte dela está armazenada em geleiras, calotas polares ou em aquíferos profundos de difícil acesso. Para uso humano direto, resta menos de 1% dessa água, o que reforça a necessidade de gerenciar de maneira eficiente e equitativa esse recurso finito. O aumento populacional intensifica a pressão sobre os recursos hídricos, tanto pela maior demanda direta (abastecimento urbano, saneamento e irrigação) quanto pelos impactos indiretos, como poluição, degradação de nascentes e conflitos de uso. 

Atualmente, estima-se que cerca de 2,2 bilhões de pessoas no mundo não tenham acesso seguro à água potável (WHO & UNICEF, 2021). Esse dado alarmante revela que o desafio não está apenas na quantidade, mas também na qualidade e no acesso. O crescimento das cidades — um fenômeno diretamente relacionado ao aumento populacional — tem ampliado as dificuldades de gerenciamento hídrico. De acordo com a NAÇÕES UNIDAS, mais de 55% da população mundial vive em áreas urbanas, número que deve chegar a quase 70% em 2050. O adensamento urbano, a impermeabilização do solo, a poluição difusa e o aumento do consumo doméstico tornam a gestão da água nas cidades um dos maiores desafios contemporâneos.

 

No Brasil, país que abriga cerca de 12% da água doce superficial do planeta, a realidade também é preocupante. Apesar da abundância hídrica em termos absolutos, a distribuição desigual da água cria contrastes marcantes. A região Norte concentra aproximadamente 68% da disponibilidade hídrica, enquanto o Sudeste, que abriga mais de 40% da população, dispõe de apenas 6% dos recursos (INSTITUTO TRATA BRASIL). Essa discrepância é agravada pelo crescimento demográfico acelerado em regiões já vulneráveis, como a periferia das grandes cidades, onde o acesso à água potável e ao saneamento básico ainda é insuficiente.

O aumento populacional também eleva a demanda por alimentos, intensificando a necessidade de irrigação agrícola, no Brasil a agricultura representa 50,5% do uso total da água doce (JORNAL USP, 2024). Com a expansão demográfica, espera-se que o consumo agrícola continue a crescer, gerando disputas por água com outros setores, como o abastecimento urbano e a geração de energia. Esse cenário evidencia a necessidade urgente de avançar em políticas públicas integradas, que conciliem segurança alimentar, segurança hídrica e conservação ambiental.

Outro ponto crítico é a vulnerabilidade das populações frente às mudanças climáticas, que se somam ao crescimento demográfico para agravar a crise hídrica. Eventos extremos, como secas prolongadas e enchentes severas, tornam ainda mais difícil o planejamento e a gestão de recursos hídricos. A segurança hídrica passa a ser um fator decisivo não apenas para o desenvolvimento econômico, mas também para a saúde pública e a estabilidade social.

Diante desse quadro, a governança da água assume papel central. A gestão integrada e participativa dos recursos hídricos, conforme preconizada pela Lei nº 9.433/1997 (Lei das Águas), é fundamental para garantir a alocação justa e eficiente da água. Além disso, é necessário promover maior integração entre políticas de recursos hídricos, saneamento, agricultura e urbanismo, de modo a otimizar o uso e a qualidade da água.

A eficiência no uso da água surge como uma das principais oportunidades para mitigar os impactos do crescimento demográfico. Tecnologias de irrigação mais eficientes, redução de perdas no sistema de abastecimento (que no Brasil chegam a uma média de 40% em algumas cidades), reuso de águas residuais tratadas e práticas de captação de água da chuva são exemplos de soluções que podem ser ampliadas (INSTITUTO TRATA BRASIL, 2023). O conceito de economia circular aplicada à água também ganha destaque, propondo a reintegração de recursos hídricos ao sistema produtivo, diminuindo a pressão sobre fontes naturais.

A educação ambiental e a conscientização da população são igualmente estratégicas. O consumo consciente e o uso responsável da água devem ser estimulados desde a escola até as políticas públicas, criando uma cultura de valorização e cuidado com os recursos hídricos. A participação social em espaços decisórios, como os Comitês de Bacia, fortalece a governança democrática e permite que as vozes das comunidades mais vulneráveis sejam ouvidas e consideradas.

Vale ressaltar que a crise hídrica não afeta todos da mesma forma. As populações em situação de vulnerabilidade social, como comunidades rurais isoladas, povos indígenas, populações quilombolas e moradores de periferias urbanas, são as mais impactadas. Em muitos casos, essas populações dependem diretamente de fontes superficiais e aquíferos rasos para consumo, tornando-as mais suscetíveis à contaminação e à escassez. Assim, garantir o direito à água — reconhecido pela ONU como direito humano essencial em 2010 — é também uma questão de justiça social e ambiental (UNITED NATIONS GENERAL ASSEMBLY, 2010).

O Dia Mundial da População convida-nos a refletir sobre como planejar cidades, campos e ecossistemas de maneira a garantir água em quantidade e qualidade adequadas para todos. A inovação tecnológica, o fortalecimento da governança, a gestão integrada e o engajamento social são caminhos fundamentais para responder ao desafio de prover água para uma população em constante crescimento. Ao mesmo tempo, a proteção e a recuperação de ecossistemas naturais, como florestas e zonas úmidas, são essenciais para manter o equilíbrio hidrológico e assegurar a resiliência dos sistemas hídricos frente a eventos climáticos extremos.

O Brasil tem uma oportunidade única de se tornar líder global em soluções integradas para água e população. A abundância de recursos hídricos, a experiência acumulada em gestão participativa e o potencial para inovação tecnológica são ativos valiosos. Entretanto, será preciso avançar rapidamente para superar gargalos estruturais, reduzir desigualdades e criar uma base sólida para um futuro mais seguro e justo. Ao unir ciência, política, tecnologia e participação social, podemos transformar os desafios do crescimento populacional em oportunidades para construir sociedades mais resilientes e sustentáveis.

Assim, ao celebrarmos o Dia Mundial da População, devemos lembrar que cada número estatístico representa vidas humanas que dependem, essencialmente, da água. Cuidar da água é, em última análise, cuidar das pessoas. E garantir que todos tenham acesso seguro a esse recurso vital é uma das maiores responsabilidades do nosso tempo.

Referências:

Instituto Trata Brasil. Preservação. São Paulo: Trata Brasil: https://tratabrasil.org.br/principais-estatisticas/principais-areas-afetadas/preservacao/

Instituto Trata Brasil. (2023). Perdas de Água Potável: Desafios para o Avanço do Saneamento Básico. São Paulo: Trata Brasil: https://tratabrasil.org.br/perdas-de-agua-2023/

Jornal USP. (2024). Setor agrícola utiliza metade da água consumida no Brasil: https://jornal.usp.br/campus-ribeirao-preto/setor-agricola-utiliza-metade-da-agua-consumida-no-brasil/

NAÇÕES UNIDAS. ONU prevê que cidades abriguem 70% da população mundial até 2050:https://unric.org/pt/onu-preve-que-cidades-abriguem-70-da-populacao-mundial-ate-2050/

UNITED NATIONS. (2022). World Population Prospects 2022. New York: UN DESA: https://www.un.org/development/desa/pd/sites/www.un.org.development.desa.pd/files/wpp2022_summary_of_results.pdf

United Nations General Assembly. (2010). Resolution A/RES/64/292: The human right to water and sanitation. New York: United Nations: https://press-un-org.translate.goog/en/2010/ga10967.doc.htm?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt&_x_tr_pto=tc

WHO & UNICEF. (2021). Progress on household drinking water, sanitation and hygiene 2000-2020: Five years into the SDGs. Geneva: World Health Organization (WHO) and the United Nations Children’s Fund (UNICEF): https://data.unicef.org/resources/progress-on-household-drinking-water-sanitation-and-hygiene-2000-2020/